domingo, 15 de outubro de 2017

"Miles Morales - Spider-man", de Jason Reynolds: lido e comentado!



Antes de dizer que terminei o livro há poucos minutos e que, sim, gostei muito, vale deixar claro que: 1) Miles Morales é, provavelmente, a única pessoa-aranha que acompanho na Marvel Comics há anos e; 2) a proposta do autor, Jason Reynolds, ressoa muito com muitas coisas que gosto muito, textos que escrevo e coisas afins - é só dar uma mexida neste blog e tal que, facilmente, se nota.

Por isso, resolvi escrever logo esta resenha, mas tentarei não ser tão tendencioso, hehe. 
Além disso, já deixando claro: você não precisa conhecer toda a "historiografia" dos Homens-Aranha, do Universo Ultimate ou do próprio Miles. A obra se sustenta por si só. Apesar disso, fica bem claro  que Reynolds leu tudo que devem ter disponibilizado a ele e, aqui e ali, pega algo da fonte - até pra evitar incongruências com o cânone, claro - e, assim, se você acompanhou Ultimate Spider-man, Guerras Secretas e além, admito que entenderá mais profundamente certas coisas. Porém, nada que mude a experiência de leitura...

Então, o que rola nessa história? Resumindo muito, é muito mais focada no cotidiano escolar de Miles e seu relacionamento com as pessoas (seus pais e Ganke, melhor amigo e colega, principalmente) e com a comunidade que faz parte do que em seus poderes e o uniforme, mas ambos ainda estão lá e implicam em muitos em muitas vantagens – tipo, tente ter reflexos e agilidade aracnídeas e jogar basquete – e problemas. Com isso, entre lidar com uma “paixonite” e uma revelação recentes, Miles ainda precisa descobrir o que ou quem está afetando o sentido-de-aranha a ponto de deixá-lo doente. Tudo desenrola a partir dessas situações.


Portanto, para mim, este livro foi uma experiência bem diferente das histórias “normais” que o Brian Michael Bendis produz nos quadrinhos mensais. Claro, só pelo resumo, nota-se que há algo estranho rolando na trama, mas é bem diferente de uma HQ, reafirmo; você não espera um ataque do Venom, uma conspiracão da Hidra ou caçada ao Abutre em cada capítulo – que seriam, comparativamente, as tantas edições de um mesmo arco.

Inclusive, foi nessa característica de se focar tanto mais nas “realidades” de Miles que o livro se tornou muito melhor. Os comentários de Jefferson Davis, o pai de Miles, sobre valorizar e fazer mais por sua comunidade e, até mesmo, as constantes lembranças de Aaron Davis, seu falecido tio – e também “supervilão”, o Gatuno –, refletem muito das intenções e preocupações que um jovem negro (e com origens latinas) da periferia de uma cidade norte-americana – e de quase qualquer outro lugar do mundo, imagino – deve vivenciar. 

Miles v Gatuno
Até caberia uma crítica negativa, nesse ponto: mostrando que, sim, leu o original, Reynolds cita muito um dos conceitos que mais detesto no texto de Bendis: que a criminalidade praticada por seus parentes - no passado, os irmãos Davis se meteram na vida bandida, sim - seria "parte do DNA" de Miles também, e ele sempre estaria sob o "risco de desandar na vida". Isso não soa um tanto quanto racismo velado, eugenia? Claro, um adolescente mascarado com superpoderes pode, sim, ter atitudes questionáveis e cometer erros sérios, mas nunca vi um autor dizer que Peter Parker devia ter "sangue de bandido" depois de quase matar Ratus (em A Última Caçada de Kraven, de 1987) ou coisa assim. Obviamente, morar na quebrada também facilita o acesso às "ideias ruins", mas fala sério, né, mano...

De qualquer forma, Reynolds inclui o quão importante é, para a comunidade de Miles, o fato que um dos seus está na "escola de gênios" e que tem um futuro brilhante pela frente. Tipo, em todo trecho onde Miles papeia com alguém do seu bairro, nota-se tanto a importância do conceito quanto da existência de personagens como ele na cultura pop... Notam, então, a diferença entre presumir de fora e viver e conhecer uma realidade? Pois é.

Parte disso, a propósito, faz parte do "mistério" da trama e dos conflitos apresentados... E os mesmos são muito atuais, considerando todo o momento sociopolítico que estamos vivendo - parece que todas as 272 páginas foram escritas há 2 ou 3 meses, logo impressas e publicadas. Há uma constante tensão envolvendo intolerância, racismo e violência institucionais, e um jovem Aranha aguentando isso... Por isso, voltando à questão da "herança genética", seria mais plausível dizer que Miles está virando uma pilha de rancor e fúria por causa dessas atitudes alheias - e sei muito bem como é, ó.

Essa imagem fez tão mais sentido após a coisa da Hidra...
Aliás, narrativamente, esses aspectos são quase sutis ao longo do texto, muito menos evidentes do que faço parecerem. Qualquer pessoa minimamente perceptiva notará o que está, de fato, sendo insinuado... Entretanto, levando em conta o pano de fundo "super-heroico" e que se trata de uma obra infanto-juvenil, nota-se que isso é intencional e, sobretudo, "alimento para os pensamentos". Para dar uma ideia melhor, é comparável ao que Ta-Nehisi Coates faz nos títulos do Pantera Negra, mas mais nas "indiretas"...

De fato, o texto de Reynolds, nesta obra, é muito simples e acessível. Em alguns momentos, até me incomodei de leve com a repetição de algumas expressões, mas as mesmas focam-se na simplicidade e é assim, afinal, que a linguagem funciona. Inclusive, por ser acessível assim, se você está muito curioso para ler e só tem um inglês básico, paciência e um dicionário online permitem ler bem tranquilamente - principalmente, considerando gírias e tal.

Miles Morales - Spider-man foi uma das melhores leituras que realizei este ano, e eu leio muito! A Marvel Press trouxe um dos meus personagens favoritos dos gibis mainstream para a prosa e, sobretudo, com isso, Jason Reynolds aborda vários temas que considero importantes não só para mim (ou pessoas como eu), mas para qualquer um que se dispõe a aprender sobre e entender determinadas questões. Espero muito que alguma editora brasileira traga o título logo para cá, e com um tratamento e qualidade tão bons quanto o original - e me ofereço pra fazer a tradução, também, hehehe... Comparando a outros aracnídeos da literatura, esta teia do aranha também uma mensagem significativa.



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